O principal objetivo deste estudo é demonstrar como a oclusão pode alterar a postura física do indivíduo e, em conseqüência, os fatores químicos e emocionais também. O aspecto estrutural do organismo envolve a postura corporal, a qual é anatomicamente determinada pela inter-relação entre ossos e músculos, que se adaptam, moldam-se e movimentam-se de acordo com as "informações" que recebem. Estas "informações" provêm dos captores sensitivos, que são capazes de gerar alterações posturais. Esses captores podem ser os olhos, os ouvidos internos, o sistema nervoso central, os pés ou o sistema estomatognático. Será dado maior enfoque ao sistema estomatognático, por ser esta a principal área de atuação do cirurgião-dentista. O sistema estomatognático é formado por elementos: 1. Passivos: -ossos de sustentação; - articulação temporomandibular; - gonfose (articulação dento-alveolar) e - dentes. - . Ativos: - mucosa bucolingual; - músculos (mastigadores, cutâneos, supra e infra-hióideos); - tendões; - glândulas e - vasos e nervos. Todas essas estruturas devem interagir de forma harmônica, para executarem adequadamente as diversas funções das quais participa esse sistema, sendo as principais: - sucção; - deglutição; - mastigação; - respiração; - fonação; - início da digestão e - equilíbrio postural. Essas funções são de extrema importância para o equilíbrio do organismo e, para que haja harmonia entre elas, todos os elementos formadores do sistema devem trabalhar interagindo adequadamente entre si. A estrutura óssea do sistema estomatognático é formada por ossos que se interligam através de sincondroses; exceto a mandíbula, a qual é ligada ao sistema por tendões e músculos, formando a articulação temporomandibular. Esta articulação é uma das mais requisitadas do corpo humano, sendo movimentada constantemente em muitas das atividades diárias, como a fala e a deglutição, por exemplo. Além destas funções, essa articulação tem importância fundamental no equilíbrio da postura corporal. Segundo CASTILLO (1999)10, a articulação temporomandibular, que se encontra entre o osso temporal e a mandíbula, consiste de duas superfícies articulatórias: - a face articular superior, que faz parte do osso temporal e apresenta uma concavidade na parte posterior (chamada de fossa mandibular) e uma convexidade anterior (a eminência mandibular), e - a face articular inferior, que é chamada de processo condilar e tem forma convexa, o que não permite uma perfeita harmonia entre as duas superfícies articulatórias. Esta falta de harmonia é equilibrada pelo disco articular. A articulação é estabilizada pela cápsula articular, pelos ligamentos extra e intracapsulares e pelos ligamentos auxiliares, como os ligamentos estilomandibular e esfenomandibular. A articulação temporomandibular movimenta-se basicamente em três direções: - movimento para cima e para baixo da mandíbula; - protrusão e retração da mandíbula e - movimento lateral da mandíbula. Esses movimentos são realizados pelos seguintes músculos: - levantadores: músculos temporal, masseter e pterigóideo medial; - depressores: ventre anterior do músculo digástrico, platisma e, como músculos auxiliares, o milo-hióideo e o genio-hióideo; - de protrusão: músculo pterigóideo lateral (contração simétrica); - de retração: ligamentos inferiores e horizontais do músculo temporal e do ventre posterior do músculo digástrico e - de lateralização: músculo pterigóideo lateral (contração unilateral). Na depressão da mandíbula, os dois processos condilares abaixam-se e depois movimentam-se para a frente, levando consigo o disco. No levantamento da mandíbula, o movimento ocorre na seqüência exatamente oposta, sendo de extrema importância a elasticidade do disco articular, o que permite a volta do côndilo à sua posição original, após uma forte distensão. Na protrusão e na retração, a mandíbula é movimentada para a frente ou para trás, enquanto que os dentes permanecem em contato. Na protrusão, os processos condilares vão da fossa mandibular até entrarem embaixo das eminências articulares. Na retração, os côndilos movimentam-se para uma posição mais posterior, dentro da fossa articular. Nos movimentos laterais, o côndilo do mesmo lado para o qual a mandíbula se movimenta gira em torno do seu eixo sagital, permanecendo na fossa mandibular. O côndilo do lado oposto sai da fossa e movimenta-se para baixo do tubérculo articular. Esses movimentos exigem uma coordenação precisa da contração de determinados grupos musculares e, para que sejam realizados de forma harmônica, é necessário um controle da postura, com base em um tono normal da musculatura. Essa harmonia e coordenação são feitas através do sistema neuromuscular e seus receptores. Para que as articulações temporomandibulares apresentem funcionamento e posicionamento adequados, é preciso que: - Os músculos utilizados para seu funcionamento tenham tensões similares, à direita e à esquerda. - A abertura e fechamento da boca sejam realizados sem desvios; ou seja, essa abertura ou fechamento não deve realizar trajetória oblíqua, em baioneta, ou em dupla baioneta. - Os freios labiais estejam centralizados e coincidentes, em oclusão e durante a abertura bucal (o exame através dos freios é mais confiável do que as linhas interincisivas, pois é mais comum um desvio dental do que dos freios). - A movimentação mandibular seja realizada sem qualquer ruído ou sintomatologia dolorosa. | |
Para que esses princípios sejam respeitados, é necessário que os dentes estejam posicionados de forma que sua oclusão ocorra sem a necessidade de qualquer desvio mandibular. A presença de um contato prematuro faz com que o sistema neuromuscular capte esse "trauma dental" e envie uma mensagem para que o posicionamento mandibular seja alterado, na tentativa de que o maior número possível de dentes se toquem. Quando isso ocorre, toda a musculatura envolvida na movimentação mandibular readapta-se, para realizar a oclusão da forma menos traumática possível. Muitas vezes, essa readaptação muscular para uma nova postura mandibular leva a um posicionamento patológico do côndilo, podendo ocorrer um mal funcionamento da articulação, que seria caracterizado principalmente por qualquer tipo de ruído ou sintomatologia dolorosa na movimentação mandibular. Além do possível mal funcionamento da articulação, deve-se evidenciar que as cadeias musculares envolvidas na movimentação mandibular também trabalharão de forma inadequada para promover uma oclusão menos traumática. Os grupos musculares antagônicos realizarão contrações com diferentes tônus, causando um desequilíbrio nas cadeias musculares do corpo todo, pois, segundo SOUCHARD (1990)14, os segmentos do corpo humano estão anatômica e funcionalmente relacionados através das cadeias musculares, cujos comportamentos elásticos caracterizam a postura. Quando na movimentação mandibular todo esse sistema muscular trabalha com um tônus normal, interagindo adequadamente entre si, observa-se que a abertura e o fechamento da boca são realizados sem qualquer desvio (tanto no sentido látero-lateral, como no sentido ântero-posterior). Se observar-se que, para haver a oclusão, não há a necessidade de qualquer desvio mandibular, ou seja, os dentes estão dispostos de modo que a mandíbula não tem de realizar qualquer desvio para uma máxima intercuspidação habitual (M.I.H.), têm-se em oclusão uma Relação Cêntrica Fisiológica dos côndilos mandibulares. Define-se Relação Cêntrica Fisiológica como sendo a posição dos côndilos mandibulares na qual os dentes estejam em oclusão e a musculatura envolvida na movimentação mandibular apresente tônus normal, interagindo sinergicamente entre si. É extremamente importante ressaltar que esta posição condilar é muito particular para cada indivíduo, sendo impossível determiná-la corretamente sem antes verificar-se o adequado funcionamento muscular | |
Segundo BRICOT(1999)3, o sistema estomatognático está diretamente conectado às cadeias musculares por intermédio dos músculos da abertura mandibular e do osso hióide, que tem um papel de pivô fundamental, mas também através dos músculos que são o contra-apoio da oclusão e da deglutição: esternoclidomastóideo, trapézio, peitorais etc. Todo desequilíbrio do sistema estomatognático poderá, através destas vias, repercutir sobre o conjunto do sistema tônico postural. Também segundo BRICOT3: O sistema estomatognático põe em comunicação as cadeias musculares anteriores e posteriores, sendo que a língua e a mandíbula estão diretamente ligadas à cadeia muscular anterior; e a maxila, por intermédio do crânio, está em relação com as cadeias posteriores, ressaltando-se que o osso hióide tem papel fundamental nessa comunicação, assim como a propriocepção entre as duas arcadas e a propriocepção da articulação temporomandibular.Os desequilíbrios do sistema estomatognático descompensam o sistema tônico postural, assim como os desequilíbrios do sistema tônico postural perturbam o sistema estomatognático, através dos núcleos do nervo trigêmeo, ao longo do tronco encefálico, e dos numerosos aferentes para as formações que intervêm no equilíbrio tônico-postural. | |
A Posição Mandibular Condiciona a Postura Corporal | |||||
MOLINA (1989)9 dividiu os músculos do aparelho estomatognático em dois grupos:
BALTERS (1955)1 já afirmava que toda anomalia dentofacial vem acompanhada de anomalias de postura .11
Através desta análise, pode-se verificar, por exemplo, que um paciente que apresenta uma oclusão de classe II de ANGLE pode estar com o osso hióide posicionado de tal forma que exerça uma tensão exagerada da musculatura supra-hióidea, causando posteriorização da mandíbula e a conseqüente oclusão em classe II. Do mesmo modo, uma posição mais superior do hióide pode levar a uma diminuição na tensão da musculatura supra-hióidea, podendo ocasionar no indivíduo uma tendência à oclusão tipo classe III de ANGLE.
Conclui-se, então, que o reposicionamento mandibular é possível e, muitas vezes, extremamente necessário, para que o equilíbrio postural e funcional do indivíduo seja adequado. | |||||
Postura Corporal de Forma Sistêmica | |||||
Tomando o paciente como um “todo” e tentando dar ao tratamento um enfoque sistêmico, cabe ao dentista atentar para todos os aspectos que estejam relacionados com o seu trabalho, sendo que o emocional do paciente pode influenciar diretamente no diagnóstico e nos resultados do seu tratamento. Estudos anatômicos tendem a utilizar imagens bidimensionais, ficando assim perdido um elemento muito importante: a vida emocional. “A emoção produz formas.” Sentimentos ou pensamentos desencadeiam reações no sistema muscular, alterando a postura do corpo.
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Conclusão | |||||
Este estudo evidencia alguns aspectos importantes da influência da oclusão na postura corporal, assim como as alterações causadas na oclusão provenientes de desarmonias do sistema tônico-postural. Percebe-se, então, a necessidade de o cirurgião-dentista saber diagnosticar a causa dos desequilíbrios oclusivos e o que estes podem ocasionar na postura corporal. A postura do indivíduo é resultado dos seus aspectos físicos, químicos e emocionais, sendo que a intervenção em qualquer um destes pode afetar diretamente os restantes. Observa-se, então, a necessidade do conhecimento sistêmico do organismo para avaliar-se a extensão de qualquer tratamento. “... um corpo que não é o corpo da vegetoterapia, nem o corpo simbólico.., mas uma arquitetura geneticamente programada, em permanente construção e desconstrução, pulsando segundo afetos, com suas câmaras e válvulas, sempre em busca de mais vida, inflando, esvaziando, adensando ou enrijecendo de acordo com seu grau de tolerância aos ritmos da excitação gerada pelas experiências de amor ou decepção, medo ou agressão, agonia ou prazer.” 8 | |||||
Referências Bibliográficas | |||||
1. BALTERS, W.: Reflexmechanismus und Funktionsablauf. Fortsch Kieferorthop, v. 16(4), p: 325-7, 1995. |
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